Chegou cedo à estação, o comboio já se encontrava na plataforma, apressou-se
a entrar e a sentar no seu lugar. Tentou
fechar os olhos, descansar um pouco, o dia estava a ser comprido e sentia o
coração acelerado, ao pé da boca, quase a sufocar de antecipação. Fez um
esforço não pequeno para se acalmar, tentou distrair-se com um bocado de
leitura e música, mas nada parecia resultar, parecia que não se conseguia
concentrar nas linhas de texto e nem as notas de música lhe soavam direito.
Forçou-se a desacelerar, a baixar a respiração, fechou os olhos para
tornar a abri-los quando sentiu o ligeiro solavanco do arranque.
O comboio avançava já com alguma velocidade quando o calor da
carruagem e o cansaço a venceram. Adormeceu.
...
Tudo se tinha passado de manhã, à vinda para Sul. À primeira vista
seria cena banal, curriqueira, tão desinteressante que a sua menção seria
enfadonha de aqui escrever ou relatar mas, acontece que, o facto de estas duas
pessoas se terem encontrado à mesma hora, nesta mesma carruagem, tinha tudo
menos o contorno regular e inimportante da coincidência que, de facto, era.
Ela estava sentada, já instalada, de livro na mão e música nos ouvidos
quando ele entrou.
Ela reparou logo nele e tentou disfarçar um tremor e as faces rosadas,
apontando o rosto e os olhos para o livro que estava a ler.
Ele não a viu de imediato, distraído como era. Tirou a gabardine e
guardou-a com o guarda-chuva no compartimento sobre a cabeça, e
confortabilizou-se no lugar.
Olhou à sua volta e só quando estendeu o olhar para mais longe é que
se apercebeu que ela estava ali, quase ao seu lado e à sua frente. Não conseguiu evitar o nó na garganta e
tentou distrair-se com o jornal que comprou no quiosque da estação.
Acasos não se explicam, coincidências situacionais em que duas pessoas
se encontram no mesmo lugar no mesmo momento, que resultam de e em acontecimentos
ou desacontecimentos de vida entre elas.
Era coincidência este encontro, um acaso, pensou cada um de per si. Já não se viam há anos, não
contactavam um com o outro, e não sabiam o que cada um andava a fazer
profissionalmente no presente.
A separação tinha sido forçada, com as ameaças subtis ou declaradas, em
mensagens perturbadoras e anónimas, que se descobriu mais tarde serem da mulher
dele ameaçando contar ao homem dela o que se estava a passar. Forçaram um
acordado desencontrar desde então.
Era este o acaso, o reencontro.
Ele tentou concentrar-se nas pessoas do seu lado, a quem sorriu, e até
começou a conversar com uma simpática velhinha que concluiu depois que mais lhe
valia ter ficado calado, pois era um bocado chata.
Sentiu que estava a ser observado, reprimiu o movimento dos olhos, não
o quis confirmar. Não conseguiu distrair-se como queria com a leitura do jornal,
a sua presença ali, mesmo não olhando para ela directamente estava a deixá-lo
bastante perturbado, e mais ficou com a lembrança de alguns dos momentos que
passaram juntos, despertando-lhe algumas descargas eléctricas que desceram do
cérebro ao corpo todo. A sua visão periférica era boa e apercebeu-se que ela
cruzava e descruzava as pernas, não em sinal nervoso, mas em outro sinal mais
perturbador, que conhecia bem.
Foi aí que ele sentiu que não se estava a controlar, sentiu ele também
o desejo aumentar e ... o sangue a
escapar-lhe do cérebro.
Ela não conseguia ler. Disfarçou o olhar com os óculos de sol. Ele
estava na mesma, talvez mais alguns cabelos brancos, um ar mais maduro, e
sobretudo com aquele aspecto que dá vontade de devorar, como ela costumava
dizer.
As visões dos dias inteiros passados fechados em motéis “flasharam-lhe”
à frente dos olhos sentindo quase o seu cheiro e sabor, e o calor do seu corpo.
Sentia-se a ferver, deu por si completamente encharcada, e só depois
se apercebe que tinha começado involuntáriamente a cruzar e a descruzar as
pernas como já não tinha memória. Precisava de fazer algo.
Levantou-se meia trôpega, e dirigiu-se à casa de banho.
Ainda teve de esperar um pouco e volta não volta ia espreitando para o
corredor. Entrou finalmente e sentou-se em cima do tampo da sanita, depois no
lavatório, e sem encontrar uma posição que lhe agradasse tocou-se em busca de
encontrar um pouco de prazer masturbando-se. Estava ensopada, lambeu a mão que
levou à boca, já nem se lembrava do seu
cheiro e sabor, com a outra mão sentiu os seios hirtos por baixo da roupa. Se
ao menos tivesse qualquer coisa na carteira que a pudesse ajudar, as unhas
compridas não facilitavam. Depois lembrou-se da escova de cabelo, o cabo não
era perfeito mas iria ter de servir.
Naquele instante, sentiu o cheio das cigarrilhas que ele fumava e não
se conteve. Entreabriu a porta para ter a certeza ... puxou-o para dentro com quanta força teve
e trancou a porta.
Tirou-lhe a cigarrilha da boca e antes que ele pudesse dizer o que quer
que fosse já a língua dela tinha encontrado a dele num beijo atordoado, frenético
e apertado.
Soltou-lhe ligeiramente a boca para lhe ordenar entre dentes um quero-te
agora! Quase imperceptível.
Ele não se fez rogado, tirou os óculos e enfiou a cara no meio das
suas pernas apertado o rabo dela contra si e sentiu-a o rabo dela todinho em
pele de galinha. Não conteve um sorriso enquanto se deliciava com o seu doce
mel.
Levantou-se lambendo os cantos da boca para que ela visse, beijaram-se
frenéticos. Ela estava perdida no meio de tanto sentir.
Baixou-lhe as calças e beijou-o, abocanhou-o e sem mais delongas.
Estás mais magro, disse-lhe depois de lhe ter arranhado com unhas de
gata prazeirosa as coxas e o rabo.
Sentou-se em cima dele e ele entrou. A entrada foi premeditadamente e
prolongadamente e lentamente lenta.
Concluiu num suspiro que afinal, ele não estava mais magro por todo.
Enfiou-lhe as garras nas costas, por baixo da camisa.
Ele segurou-a contra si, fazendo subir por debaixo da blusa de seda as
suas mãos, tocando-lhe o colo do peito, procurando nas costas o sentir não
esquecido do toque suave da sua pele, apertou-lhe os mamilos muito ao de leve e
um por um.
As suas bocas não pareciam descolar.
Não vais tirar os óculos de sol? Quero ver os teus olhos.
Ela tirou os óculos. Os olhos eram os mesmos, castanho-mel, e não os
tiraram um do outro, sempre abertos e expressivos, carregados de desesperante
desejo e deleite.
Levantou-a em peso e sentou-a no lavatório, apertou-a conta si. Ela
tentou-se equilibrar o melhor que pode, as pernas contra a porta da casa de
banho e uma das mãos, volta não volta, no tecto. O equilíbrio era difícil e ela
e ele pareciam possuídos de forças que não sonhavam que tinham. Ele esforçou-se
o melhor que pode para manter o rabo dela nas suas mãos, que eram grandes
demais para aquele delicioso rabo pequenitamente delicioso e perfeito que não
tinha agora tempo para mordiscar como adorava fazer.
Foi um caminho feito de reencontro, frenético, ardente, sôfrego, esforçado,
de prazeres atingidos em uníssono sincronizado, que ambos tiveram de calar em
gritos de bocas fechadas e línguas já cansadas.
Com as pernas bambas, sentaram-se na sanita, ele não a deixou sair,
manteve as mãos sempre no lugar, se bem que, agora em suaves carícias, enquanto
trocaram beijos leves carregados de mimo e ternura no rosto um do outro.
Que foi isto? – perguntou ele.
Desculpa, não me conter, tenho tantas saudades tuas, do teu corpo, da
forma como nos amamos, do teu jeito de me tocares, do teu cheiro (inalou
profundamente o pescoço dele, todo suado), e do teu sabor (chupou-lhe a língua
quase a magoar).
Apertou-a.
Loucura, nunca tinha imaginado como uma casa de banho tão minúscula
pode ser tão grande. Só mesmo tu. Obrigado doçura. Louca, tu. (beijo)
O comboio iniciou a travagem.
Ele arregalou os olhos e, reality check, disse urgente, enquanto olhou
do relógio. Devemos estar a chegar a Coimbra, a minha saída.
Sem palavras arranjaram-se, um compondo o outro o melhor que puderam.
Ainda passaram uma água pela cara. Ela compôs a maquilhagem. Saiu um de cada
vez, sentaram-se a intervalos temporais separados.
Ela quase num grito chamou o nome dele e apontou para fora.
Ele desatou a correr, quase perdeu a saída, o comboio quase arrancar,
saiu aos tropeções e ... lembrou-se da gabardine e guarda-chuva quando sentiu
as gotas de chuva no rosto.
O comboio já ia no final da plataforma quando retomou o fôlego.
Deixou-se ali ficar um pouco, de braços abertos, sentindo a chuva do
rosto e na cabeça.
Sentiu-se bem. Talvez livre ou feliz, não se preocupou em saber.
...
Acordou com a travagem do comboio quando este se aproximou da estação,
não porque fosse brusca, mas porque algo lhe disse que tinha chegado. Ficou tão
alerta como daquela vez que tomou um café duplo e os seus olhos tão abertos que
pareciam colados.
Estava a chegar a Coimbra, e pelos seus cálculos e por hábitos
recordados, desejou que fosse ele entrar na viagem de regresso.
Depois do comboio arrancar, já com toda a gente sentada, percorreu-o
devagar, de uma ponta a outra, tentando não dar a notar do que estava à
procura.
A velhota que ia ao lado dele de manhã estava lá, num sítio qualquer,
e olhou-a com um olhar esquisito, talvez... reprovador, não percebeu.
Ficou triste, profundamente triste, apetecia-lhe chorar, chorar como
as bátegas de chuva que fustigavam o comboio. Conteve-se.
Tinha nele (e ele nela também) alguém que lhe completava uma parte do
seu ser. Sem promessas, sem compromissos, se entregavam numa partilha desmedida
de descomprometida, carne na carne, unos. Foi esse recordar, no encontro
fortuito da manhã que a tinha perturbado mais.
Na estação o marido esperava-a. Beijou-a e apercebeu-se que algo não
estaria bem.
A enxaqueca, já sabes, não gosto de andar de comboio.
...
Ele tinha chegado à estação a tempo de ver o comboio já bem lançado no
final da plataforma.
Foda-se! Gritou para toda a plataforma ouvir.
Teve de regressar em outro comboio, mais lento, mais tarde.
Foi o caminho todo perturbado, sem conseguir pregar olho, agarrado à
deliciosa e perturbadora memória do que
tinha sido a viagem da manhã.
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